Folhetim #2 – terça-feira

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O lugar parecia uma sala de espera ordinária, comum à dentistas, psicólogos e demais profissionais que prospectam a dor, primeiro na alma e depois na carteira. Talvez a proposta de “amarrar o amor” estivesse então de acordo com o cenário, pois o exercício nada traria de prazeroso à uma das partes e certamente não seria barato. Aliás, pensava ela agora ao folhear revistas datadas de três meses, nada de bom traria a qualquer um dos dois – não havia amor passado que ela desejasse particularmente converter em presente nem futuro – o que afinal estava fazendo ali?!

A pergunta se anunciou com demora, pois aguardando ali em frente à enigmática recepcionista e sua simpática feição de “devoro-te ou… devoro-te”, ouvia seu nome chamado por entre devaneios – é a sua vez.

Suzana, agora novamente empossada de si, tentou recuar seus passos em direção à porta, mas pesou sobre seu ombro um punho cheio de braceletes e penduricalhos reconduzindo-a ao interior da sala, onde ficava a porta do “consultório”. O movimento era assim descrito, de si para si, pouco correspondendo aos fatos, procurando nessa miragem justificar o impeto inexplicável que a levou até ali – passara do ponto de não-retorno.

O pequeno quarto no qual entraram respeitava os ditames sóbrios de um psicanalista: duas poltronas contrapostas, um divã próximo a uma delas; estantes e quadros forrando as paredes; iluminação e ar artificiais (o cubículo ficava no centro do edifício comercial). Sondou o olhar da mística, a incrível Cassandra , conforme anunciada, por trás de seus óculos de meia-lua, dividida entra uma desculpa, pela ofensa em aparecer até ali sem motivo; e um desafio, lançar mentiras para ver até onde a leitura a frio da falsária a conduziria.

– Sonhei com você, essa noite  –  disse ela, antes que Suzana decidisse por uma das propostas e, com apenas uma frase, amarrou-a ainda mais à essa trama com seu amor pelo mistério.

[continua…] 

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